sábado, 27 de agosto de 2011

Resistência




Tu permaneces...
Resiste.
Indestrutível.
Inabalável
Como árvore centenária,
Monumento histórico,
Sete Maravilhas do Mundo.
Parece não te importar
Quando
Um dia te tiraram
O frescor da pele,
O brilho dos olhos.
A cor dos cabelos.
A força do teu corpo...
Andas insistindo
Nos afazeres domésticos
Na poeira que ninguém vê
No quadro torto que não notei...
O que te fez resistir à tormenta?
O sofrimento é opção constante,
Tua cruel companhia...
Mas tua força
É de uma criança recém-nascida
A chorar insistentemente por comida
Não há mal que dure para sempre?
Do teu lado
Serei eternamente aprendiz
Da tua incontestável
Habilidade de renascer...

                                                                         Aline Monteiro

Minha avó Alzira nasceu no Dia da Poesia, 14 de março, e tem os olhos verdes mais lindos e expressivos que eu já vi(vi), na foto com o bisneto Henrique.



"A meu favor
Tenho o verde secreto dos teus olhos"
(Alexandre O'Neill)

sábado, 20 de agosto de 2011

Instante


... e o sol se pôs
Tão bonito,
Tão de repente...
Em minhas mãos
Repousam quietos
Os últimos segundos
Do dia.
Me escapam
Antes que eu perceba.
Não há nada
Que eu possa fazer.
As cores apagaram
E tudo era escuridão...

                                                                         Aline Monteiro

"Aconteceu
O que aconteceu
Foi melhor assim
Estava por um fio
Estava por um triz
Estava no fim
Todo mundo via
Que acontecia
Pois aconteceu
Era o que devia
Quando um descaminho
Acha o seu desvio
Tudo se alivia
Foi melhor assim
Quando dei por mim
Já estava aqui e agora"

(Aconteceu - Marisa Monte e Arnaldo Antunes)

quarta-feira, 17 de agosto de 2011

Boca da noite



Minha agenda 2011,
Tua caneta pencil e
Uma frase solta:
“O poema é um artigo público”.
Poema, crônica ou conto?
Não sabia dizer
Mas estava lá escrito
Na página 20 de maio, sexta-feira
Fim de tarde, boca da noite:
“O poema é um artigo público”...
Dalí nada mais nascera.
As seis palavras se fizeram frase
E ponto final
Ou melhor, sem ponto
Apenas aspas no início
Aspas que ficaram abertas
Sem final
Nem feliz, nem triste
Sem final, apenas
Aspas abertas...
Abertas como janelas,
Como portas
Desejando boas vindas
Abertas a quem
Está de partida
Abertas a quem
Está voltando
Abertas para quem
Sempre esteve ali
Parado, quieto
Observando
À espreita
Como quem aprendeu
A hora certa
Das coisas
A hora certa
De tudo...
Até das palavras
De seis palavras
Seis pequenas palavras:
“O poema é um artigo público”...

                                                                               Aline Monteiro

Para minha amiga-poeta Janete Lacerda (te ler é irresistível)

“O suor
Exaurido dos meus poros
Tem sabor salgado
Eu sei que isso é óbvio
Tudo é óbvio
Mas triste é um poeta calado
Por fazerem ouvidos mortos
Ao apreço de se compor.”
(Ceticismo I - Janete Lacerda)

segunda-feira, 15 de agosto de 2011

Estante



Esse moço lindo
Que sabe escrever
Os poemas mais tristes
De amor
Sabe como ninguém
Vender a sua dor
Troféu
Com lugar privilegiado
Na estante
No centro
Acima dos livros
Dos grandes poetas,
Filósofos, teóricos...
Acima dos discos
Dos mais ouvidos:
Joplin, Beatles, Pink Floyd ...
Dos VHS’s
Campeões de bilheteria,
Os mais queridos:
Chaplin, Gene Kelly, James Dean...
Está para quem quiser ver,
Para quem quiser comprar
Pagar para ver:
O moço, a dor, a estante...

                                                            Aline Monteiro

“Olha só que cara estranho que chegou [...]
Exibe à frente o coração
Que não divide com ninguém [...]

Faz parte desse jogo
Dizer ao mundo todo
Que só conhece o seu quinhão ruim
É simples desse jeito
Quando se encolhe o peito
E finge não haver competição
É a solução de quem não quer
Perder aquilo que já tem
E fecha a mão pro que há de vir”.

(Cara estranho – Marcelo Camello)



quinta-feira, 11 de agosto de 2011

Bem



Raros são os sorrisos
Prende-os em teus olhos
Guarda-os
Como achado
Há muito perdido
Raridade
Flor que desabrocha
Uma vez por ano
Fotografa-os
Leva-os contigo
Alimenta-os
Faz deles
Teu tesouro
Bem precioso
Pinta-os
Enfeita-os
E para que
Não desapareçam
Ame-os.

                                                               Aline Monteiro


“Há de surgir
Uma estrela no céu
Cada vez que ocê sorrir”

(Estrela – Gilberto Gil)


domingo, 7 de agosto de 2011

Depois do carnaval



Chegaste sorriso,
Eu te recebi colo.
Foste todo boas-vindas,
Fui inteira porto.
Repetiu palavras minhas
Como se fossem tuas,
Fui ouvida
Pela tua voz.
Me fez cama de versos,
Me deitei sem dormir
Para te ver bem... Perto
Nos olhos,
Atrás dos óculos,
Antes da alma.

                                                                Aline Monteiro

Para meu amigo Alex Rodrigues

"Te adoro e você vem comigo 
aonde quer que eu voe..."
(Pra ser sincero - Carlinhos Brown e Marisa Monte)

segunda-feira, 1 de agosto de 2011

Causa perdida





Perder-se
É encontrar-se.
Dançar sem coreografia.
Perder a timidez por
Horas e horas e
Deixar que a música
no teu ouvido
Te ensaie...
Ouvir a melodia
de dentro para fora.
Perder-se é ouvir teu arrepio...
É ficar de cara
Com o espanto,
É gostar dele...
Perder-se é
Trocar os passos.
Propositadamente
Errar o caminho,
Perder-se é fuga!
É encontro ao acaso,
Desencontro marcado,
Partida...
Sem despedida.
Perder-se
É ganhar equilíbrio,
Transpirar emoções,
não medir sorriso,
reparar sorrisos...
Perder-se é
Não saber cair,
Saber deitar...
Ir embora.
Perder-se é
Tirar a roupa,
Se despir do obvio.
Desapego...
É silêncio (de dias contados)
Fim marcado.

Perder é ganhar...

                                                      Aline Monteiro


"Todo momento de achar é um perder-se a si próprio"
(Clarice Lispector - A paixão segundo G. H.)