sexta-feira, 26 de abril de 2013

16 de Setembro



Quando nasci um anjo bobo
Vestido de arlequim disse:
-Vais fazer da palavra teu carnaval de versos
Vais colorir de vermelho-alaranjado o pôr-do-sol
Que anda desbotado de telespectadores
Vais fotografar sorrisos, desses que escandalizam
De tanta beleza
Vais explorar a linguagem ao invés da gramática
Porque linguagem é roupa e não cabide
E toda vez que disserem
Jogando palavras tortas ao vento
Insinuando descaradamente que a forma
É mais importante que o sentimento
Abrirás tuas alas
Espalhando feito confete e serpentina
A tua poesia na avenida
Cantando nas marchinhas os poetas preferidos:
Aqui estão os meus padrinhos
Que iluminaram o meu caminho
Adoçaram meu cotidiano
E me inundaram de possibilidades!
Quando nasci
O anjo-arlequim
Brincou junto comigo
Meu carnaval de versos!


                                                               Aline Monteiro


"Quando nasci era um dia amarelo
Já fui pedindo chinelo
Rede café caramelo
O meu pai cuspiu farelo
Minha mãe quis enjoar
Meu pai falou mais um bezerro desmamido
Meu Deus que será bandido
Soldado doido varrido
Milionário desvalido
Padre ou cantor popular
Nem Frank Zappa nem Jackson do Pandeiro
Lobo bom ou mau cordeiro
Mais metade que inteiro
Me chamei Zeca Baleiro
Pra melhor me apresentar"

(Vô Imbolá - Zeca Baleiro)

Tempo Achado

                                                                                         Foto: Aline Monteiro


Tempo ruim é aquele
Que a gente aproveita
Tempo bom
É aquele que a gente perde...


                                                                     Aline Monteiro



"Todos os dias quando acordo
Não tenho mais 
O tempo que passou
Mas tenho muito tempo..."
(Tempo perdido - Legião Urbana)

quinta-feira, 25 de abril de 2013

Liberdade



A palavra é a minha voz
Sou eu quem segura as rédeas
Mas é sob a palavra que caminho.


                                                            Aline Monteiro



"Porque sou humano e creio no divino da palavra"
(Credo - Elisa Lucinda)

quarta-feira, 17 de abril de 2013

Serenata



Não tenho voz que te alcance
Meu amor em serenata desafina
Por isso escrevo,
Componho um verso
Que delira...
Até virar canção em tua boca...



                                                      Aline Monteiro




“a poesia deste momento inunda minha vida inteira”
(Poesia – Carlos Drummond de Andrade)

domingo, 14 de abril de 2013

Dois em Um



É hoje que desisto da poesia
Essa fonte doce e amarga
De sentidos...


                                                           Aline Monteiro


“Não ser é outro ser”
(Fernando Pessoa)

sábado, 13 de abril de 2013

Deste Lado

                                                                    Foto: Aline  Monteiro


Não sei o que há do outro lado
estico o pescoço,
Olhos por cima do muro
Um horizonte microscópico
É uma música estrangeira
Tocando em meu país Tupiniquim
Rebeldia violenta
Palavras agressivas
Sem raiz etimológica
Linguagem e corpo
Sinais que não se correspondem...
Deste lado
O lado que me cabe e que me expande
Não há nada
Teoria, partitura...
Apenas um horizonte
Esticado, e muito bem esticado, por Bernardo
A estúpida e bela Maria-sem-vergonha
Descrita por Elisa
O ex-voto de Adélia
A canção eterna de Cecília
Irene entrando no céu
O Jesus-Menino de Fernando
A jabuticabeira de Vinícius
As cerejas e engrenagens de Alice
A menina bordada de Marcelo
E a janela sempre aberta
De Mário
Me salvando constantemente
Do afogamento.


                                                                  Aline Monteiro




“Todas as coisas cujos valores podem ser
Disputados no cuspe à distância
Servem para a poesia”
(Matéria de poesia – Manoel de Barros)

quarta-feira, 10 de abril de 2013

Encontro



Em uma noite muito quente nos encontramos
Sentamos à mesa posta na calçada
À beira da rua
Rio de carros correndo apressadamente
Para o dia de amanhã
Em meio à conversa
A chuva forte e inesperada
Falava sobre ventos passados...
Saudades vorazes...


                                                                   Aline Monteiro


“e se choro
Choro baixo e ninguém vê
Minha lágrima de sal
De saudade de você”
(Olhos claros – Eliakin Rufino)

terça-feira, 9 de abril de 2013

Planos Para o Futuro



Olha, preciso te contar
Dizer que não tem jeito não
Eu te amo, criatura!
Assim como a poesia ama a palavra!
Já conseguiu imaginar uma sem a outra?
Pois é, eu era palavra solta, sem contexto
E você meu doce pretexto de existir
E dar sentido a tudo o que digo
Mas sabe aquela interrupção quando a gente fala?
Sabe aquele ruído?
Sabe quando alguém passa em frente à TV
Bem no exato momento do gol?
Sabe aquela lágrima?
Aquela de saudade
Mas não é qualquer saudade não, viu?
Digo aquela saudade
De quando viramos as costas um pro outro
Sem combinar o que jantaríamos no dia seguinte...
Foi aquela dita lágrima
Ordinária de tanta beleza, gota salgada
Transeunte na cor de tua pele
Estrela cadente num céu infinito
A minha interrupção, a minha palidez
A minha mudez, a minha insensatez...
Olha, preciso te contar
Não tem jeito...
Eu sou a palavra,
E você o meu contexto
O contexto, amor!

                                                                         Aline Monteiro


“Me traz o seu sossego
Atrasa meu relógio
Acalma a minha pressa
Me dá sua palavra
Sussurra em meu ouvido
Só o que me interessa”
(É o que me interessa – Lenine)

segunda-feira, 8 de abril de 2013

Menina Bordada



Ando bordando planos em teu travesseiro
Mesmo sem te conhecer ainda...
Bordados andam também meus sonhos
de te imaginar,
Desejar minúcias ao teu lado...
Já começo a escutar tua vozinha
A derreter meu coração-manteiga
De tia mais coruja do mundo:
- Tia, o que é isso? Tia, lê pra mim? Tia, o que tá escrevendo?
E enquanto tua voz não chega
Pra eu carregá-la no colo do meu poema
Bordo planos em teu travesseiro,
Escrevo teu nome em meus sonhos...


                                                                 Aline Monteiro



“Tudo que eu fizer vai ser pra ver aos olhos dela, vai sobrar carinho se faltar estrada ou carnaval”
(Ôo – Marcelo Camelo)

sábado, 6 de abril de 2013

Devoção



Poesia é beleza selvagem
Cavalgando doida
Montanhas, vales, desertos
Se quero vê-la
Me antecipo em sonhos, previsões
Espero na linha de chegada
Ansiosa, atenta
Quando ela surge
 avassaladora
Meus olhos em procissão
A recebem
Me aproximo vagarosamente
Beijo-lhe as mãos
Sou devota dela!

                                                                        Aline Monteiro


“É de ferro a roda dentada dela!”
(Sedução – Adélia Prado)

quinta-feira, 4 de abril de 2013

Ana de Papel


Ana me diz que não quer mais ouvir canção,
Cantar a música colorida dos palhaços adestrados
Que repetem, repetem, repetem...
Ana quer pintar novidades no papel,
Desenhar a circunferência das coisas...
Ana quer fazer dobradura dos sonhos...


                                                                      Aline Monteiro



“Sua cartilha tem o A de que cor?”
(Relicário - Nando Reis)